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terça-feira, 14 de dezembro de 2021

LICÂODEWIDA

Há algum tempo em uma pequena cidade onde todos se conhecem, um médico que tinha uma fazenda, na qual cultivava frutas, foi vender sua produção de pêssegos em lata para o dono do supermercado local.

                O dono do supermercado recebeu o médico para a negociação e chorou desconto, chorou prazo. Sabedor de que o fazendeiro teria dificuldades em vender a produção em outro lugar porque o frete encareceria o produto o dono do supermercado negociou o quanto pode e quando conseguiu o valor que queria ainda disse: quando for enlatar, retire um pêssego por lata que além de nós, ninguém vai perceber...

                Decepcionado, o médico fazendeiro foi embora jurando que da próxima vez perderia a produção, mas não venderia para o sujeito.

                Poucos meses depois o dono do supermercado passou mal, com uma apendicite fortíssima, entrou no pronto socorro onde o médico plantonista disse que precisava operar urgente, que a estrada ruim não permitiria a remoção. Como o plano de saúde do dono do supermercado só tinha cobertura na capital, ele teria que pagar a cirurgia e naquela cidade só o médico fazendeiro tinha especialização para isso.

                Imediatamente e ainda se contorcendo de dor, o dono do supermercado começa a regatear no preço da cirurgia, dizendo que o médico estava encarecendo o procedimento porque ele não tinha como procurar outro. Que todo mundo sempre tinha gordura pra tirar, que sempre havia como reduzir algum custo.

                Sem discutir o Médico imediatamente abateu 20% do valor da cirurgia e encaminhou o dono do supermercado.

                Tão logo entrou na sala de cirurgia começaram a amarra-lo à maca. Ao perguntar o porquê, o médico disse: “sempre há onde enxugar os custos, eu dispensei o anestesista. Mas fique tranquilo, além de nós, ninguém vai perceber”...

Alguns seres humanos nunca estão satisfeitos. Em busca de ganhar sempre pechincham, regateiam, desvalorizam o esforço alheio, pedem desconto, mas na hora de repassar seu produto, aí lembram dos argumentos de que tem a inflação, tem a crise, tem o preço do petróleo, tem os custos, o aumento da energia e não repassam absolutamente nada para o cliente.

 

 

 

 


quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Preceito

 Há quase três anos de minha iniciação estou novamente acompanhando um preceito. Mesmo sem ser Padrinho Pequeno, estou aqui, por força de circunstâncias, zelando por um Dofano. 

É incrível como é rica essa segunda experiência, ter essa percepção do caminho a ser trilhado pelo outro, das obrigações diante do nascimento de um novo Orixá. 

Faz a gente rever cada passo do nosso preceito, aquilo que não deu tempo da gente aprender ou sentir porque estávamos preocupados em fazer o certo sem entender totalmente o porquê.

O Preceito é uma gestação poderosa. Uma oportunidade única na vida de realmente refletir e renascer literalmente. Deixando pra trás mágoas, traumas, defeitos, inimigos. Levando adiante só o que temos de melhor.

Encerrar o preceito e renascer na comunhão com o Orixá é descobrir que o nome que a gente carrega nos documentos é só um pseudônimo que carregamos pela vida até recebermos nosso verdadeiro nome, entregue por nosso Orixá. 

A partir daí a responsabilidade aumenta, não usamos mais pseudônimos, somos responsáveis por assinar a obra do resto de nossas vidas tendo por nome a essência que o Orixá nos deu e por sobrenome o próprio Orixá. A ele responderemos por nossos atos, erros e acertos... 

Iniciar-se no Orixá, Sair no Orixá, Sair no Santo ou no Sagrado, Fazer o Orixá ou o Santo. Tantas expressões para simbolizar uma comunhão definitiva com a energia que nos criou e que nos define, mas não nos rege... 

Como é lindo este momento e como é precioso participar dele como observador, como zelador, como aquele médico obstetra que jamais se cansa de contemplar o milagre da vida, não interessa quantos partos ele realize. 

Só o que peço é que quando chegar minha vez, eu possa ter sabedoria pra transmitir pra cada um a importância e a beleza deste ato, a imensa sacralidade que ele envolve e acima de tudo a chance única de refazer toda a nossa história sem precisar morrer e reencarnar novamente. Hoje se pudesse pediria pra dobrar os prazos porque acho que não aproveitei o suficiente a oportunidade que me foi dada. Mas a sabedoria que pedi então, tá me ajudando a fazer as correções durante o percurso. Que Oxosse não me deixe perder nunca a vontade de aprender sempre. 

Iberê de Oxóssi

 No dia em que meu Pai Oxósse e eu nos fizemos um, eu recebi outra família, outra história, outra ancestralidade para somar com a minha, e outro nome


IBERÊ: Rio que Arrasta. 


Confesso que apesar de eu gostar da sonoridade do nome, o significado me preocupou. Eu que sempre tive todas as minhas conquistas com tanta dificuldade pensei, será que será sempre este meu destino? Lento e arrastado.


Então Nanã me lembrou que na beira dos rios lentos se formam os melhores mangues, o lugar especial para a transmutação a fertilidade e a vida.


Xangô também me levou ao alto paredão de pedra dos belos canyons pelo mundo afora e me mostrou lá no fundo o trabalho que Tempo e um rio lento podem fazer. 


Oxum me mostrou que mesmo o mais lento rio ainda há de cair do alto em rara beleza e força na busca de seu caminho pelo Reino de Abaluaê


Ogum me mostrou que todo progresso do homem do cultivo, da caça, da pesca, da navegação, começou sempre ás margens de um rio lento.


Iemanjá me disse que eu aproveitasse a lentidão da viagem para aprender, que eu parasse nas curvas para conversar e ensinar. Que eu brilhasse nas quedas para dar exemplo porque rápido ou lento em Seu seio eu iria, um dia, desembocar. 


Então minha Mãe Iansã me disse: Calma Iberê. Tudo na hora certa. Pois só o incauto entra no rio manso sem se precaver  da força e do poder que o mais calmo dos rios alcança quando  eu me manifesto!


E Oxalá? Ah Oxalá ele sempre esteve ali. A iluminar meu percurso. Pois sem a luz, a fertilidade não existe, a cachoeira não brilha, a beleza não se vê, a natureza não se aprende.


Acordei. Mais IBERÊ que nunca!